sábado, 26 de setembro de 2015

Crianças com câncer continuam os estudos em sala de aula dentro de hospital

Em tratamento, as crianças podem ter aula de português, matemática, ciências, geografia, história e artes / Cinthya Leite/Especial para o JC

Em tratamento, as crianças podem ter aula de português, matemática, ciências, geografia, história e artes

Cinthya Leite/Especial para o JC

Um projeto pioneiro em Pernambuco ajuda crianças com câncer a vencer a dor, a luta e o medo que geralmente acompanham a doença. Essa superação surge numa sala de aula instalada no Centro de Onco-Hematologia Pediátrica (Ceonhpe) do Hospital Universitário Oswaldo Cruz (Huoc). Batizada de Semear, a primeira classe hospitalar do Estado tem a missão de realizar um trabalho lúdico e educativo que possibilita à criança internada dar continuidade aos estudos quando estão em tratamento contra o câncer, seja no leito de enfermaria ou no espaço criado no Huoc especialmente para as aulas. 
Em 10 meses de atividades pedagógicas, a Semear já apresenta resultados que mostram como essa modalidade de atendimento educacional impulsiona a aprendizagem e resgata o bem-estar dos pequenos pacientes. Das 17 crianças que frequentam a classe, duas chegaram ao hospital sem saber ler ou escrever. A boa notícia é que ambas estão em processo de alfabetização e já conseguem ler palavras simples. 
É o caso do aluno Lucas Kawan Delmondes, 9 anos, que faz tratamento para leucemia no Ceonhpe. Para ele, a sala de aula do hospital serviu como oportunidade de ingresso à vida escolar. No município de Trindade, Sertão de Pernambuco, onde mora, Lucas Kawan nunca estudou. Mas, assim que iniciou o tratamento da leucemia, começou a descobrir o mundo da aprendizagem. “Eu agora sei escrever meu nome”, vibra o garoto, que fez questão de escrever o nome ao lado do boneco que pintou durante a aula de artes, como forma de mostrar que tem respondido positivamente ao processo de iniciação à leitura e escrita. 
E para provar que uma criança alfabetizada se torna um cidadão crítico, Lucas Kawan conta que já sabe o que deseja ser quando crescer. “Vou ser doutor.” E ele explica o motivo: “Eu quero furar os outros, do mesmo jeito que fazem para cuidar de mim”, diz o menino com um sorriso imenso no rosto, ao se referir aos furinhos que ganha na mão para receber o acesso venoso que facilita a aplicação de medicamentos através de uma bomba de infusão – máquina que o acompanha na sala de aula no hospital e que calcula de forma precisa a dose de quimioterapia. 
Lucas Kawan sabe que esses furinhos são importantes para a sua recuperação. “Tem dia que não dá para estudar porque eu fico muito aplasiado”, conta ele, se referindo a um termo que aprendeu a usar depois de tanto ouvir os médicos, à beira do leito na enfermaria, definirem uma condição em que o paciente com câncer fica com imunidade baixa devido à queda das taxas de leucócitos, plaquetas e hemácias.
“"Se oferecemos continuidade ao ensino dos conteúdos da escola de origem desses pequenos pacientes, é porque acreditamos na cura", diz a oncologista pediátrica Vera Morais, presidente do GAC-PE
”

Assim como outros alunos da Semear, Lucas Kawan é um exemplo de que a classe hospitalar é valiosa para a garotada se sentir produtiva no papel de aprendiz e aceitar o tratamento com otimismo. “Entendemos que a classe hospitalar funciona como um renascimento da criança internada. Se oferecemos continuidade ao ensino dos conteúdos da escola de origem desses pequenos pacientes, é porque acreditamos na cura”, diz a oncologista pediátrica Vera Morais, presidente do Grupo de Ajuda à Criança com Câncer de Pernambuco (GAC-PE). 
Foi a instituição que teve a ideia de criar a primeira classe hospitalar de Pernambuco. Para tirar o projeto do papel, o GAC-PE se uniu à Prefeitura do Recife, ao Huoc e ao Instituto Ronald McDonald – este último forneceu recursos financeiros para a implantação da estrutura da Semear, que segue estratégias estabelecidas pelo Ministério da Educação (MEC) para oferta desse tipo de atendimento pedagógico.
Atualmente, 17 crianças entre 6 e 12 anos fazem parte da classe hospitalar. Enquanto recebem atendimento de uma equipe multiprofissional, elas têm aula de português, matemática, ciências, geografia, história e artes. Um detalhe importante, durante o processo de aprendizagem, é o respeito das limitações de cada um. “Há dias em que as crianças estão indispostas por causa dos efeitos colaterais do tratamento e, por isso, não têm condições de participar das atividades. Então, preciso estar preparada para perceber essas particularidades e só retomar as aulas quando os pacientes se restabelecerem”, diz a professora da Semear, Cristiane Rose Pedrosa, lotada na rede municipal de ensino. 
Em cada ensinamento transmitido aos alunos, seja nos leitos de enfermaria ou na própria sala de aula, Cristiane faz questão de abrir um largo sorriso para ensinar que somar, dividir, subtrair e multiplicar são algumas das muitas lições que podem ser aprendidas enquanto a garotada está em tratamento para debelar o câncer infantojuvenil, cuja taxa de cura chega a 70% quando diagnosticado precocemente e tratado em unidades de saúde especializadas. 

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