quarta-feira, 29 de julho de 2015

ESTUDO INÉDITO: Especialista analisa a nova lei das Guardas Municipais e seus impactos na segurança pública brasileira

O professor universitário e coronel da reserva da Polícia Militar do Estado do Espírito Santo Júlio Cezar Costa, um dos mais renomados estudiosos da segurança pública da atualidade, analisa, nesta entrevista exclusiva ao Blog do Elimar Côrtes, a lei que criou o Estatuto das Guardas Municipais no Brasil e seus impactos para a sociedade. O professor Júlio Cezar (à direita na foto), em parceria com o também coronel da reserva João Antônio da Costa Fernandes (E), publicou em 2012 a obra “Segurança Pública: convergência, interconexão e interatividade social”, que teve a 1ª edição completamente esgotada em poucos meses após ser publicada.
O foco da entrevista do professor Júlio Cezar Costa é a Lei Federal nº 13.022, publicada no Diário Oficial da União em 11 de agosto de 2014. Esta Lei discorre sobre as Guardas Municipais e é chamada de “Estatuto das Guardas Civis”. A análise feita pelos dois coronéis ao final da entrevista é um estudo inédito a respeito do Estatuto das Guardas Civis Municipais.

O governo federal, através da lei, introduziu importantes medidas que, sem alarde, têm trazido à possibilidade de municipalização da segurança pública, principalmente no que se refere ao trabalho das Guardas Civis de modo concorrente com as Polícias Militares. “Para muitos, estamos iniciando um novo ciclo na segurança pública brasileira”, diz Júlio Cezar Costa.
O assunto gerou, inclusive, a reação de Associações de Oficiais das Polícias Militares que enxergam essa lei como um instrumento de desmobilização dos atuais afazeres dessas instituições seculares no Brasil.
Existe já uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) ajuizada perante o Supremo Tribunal Federal, questionando a validade do conteúdo da nova lei, pois, segundo argumentos de Associações Militares de Policiais (oficiais), o Estatuto das Guardas é uma peça inconstitucional.
Enquanto nada se decide no STF a respeito, o Blog do Elimar Côrtes traz para você, em primeira mão, uma análise detalhada, artigo por artigo desse Estatuto que está dando o que falar. A análise mais profunda está no final da entrevista com o coronel e professor Júlio Cezar Costa. Os comentários são de autoria do entrevistado e também do coronel João Antônio da Costa Fernandes.
Blog do Elimar Côrtes – Professor, como o senhor vê a edição desse Estatuto que permite substituição dos afazeres das Polícias Militares pelas Guardas Municipais?
Professor Júlio Cezar Costa – Na verdade, desde 1988 a Constituição inaugurou um marco diferenciado no ambiente da segurança pública, pois o capítulo III do Título V da Carta, em seu artigo 144, emoldurou um sistema verticalizado no qual subliminarmente estão inseridas as Guardas Municipais, e agora a Presidente da República usa esse argumento para introduzir no mundo jurídico a Lei 13.022.

– E qual a consequência dessa ação da presidente Dilma Roussef, ao sancionar o Estatuto das Guardas Municipais?
– Gerou reação imediata nos segmentos de comando das Polícias Militares, e principalmente a insatisfação entre a oficialidade. Fica claro na lei a transferência de atribuições na esfera da atividade ostensiva de “patrulhamento”, que agora pode ser realizada diretamente pelas Guardas Civis, em complemento ao trabalho das Polícias Militares.
[22h24 25/07/2015] Moisés Santana: Houve mudanças significativas no que existia?
– Sim. A lei endereça a possibilidade da municipalização dos serviços ostensivos de segurança pública a partir das Guardas Municipais, deslocando a tarefa antes exclusiva das Polícias Militares para o campo municipal. É bom que se diga que a Lei muda o padrão constitucional vigente até então, de modo silencioso.

– O senhor poderia citar algo que é uma inovação trazida pela Lei?
– O legislador trabalhou o protagonismo das Guardas Civis Municipais (GCM) no ambiente de relacionamento societal, derrubando o antigo cenário da operação de segurança pública (anti-participativo) para outro em que se emoldura a participação compromissada da GCM em parceria com a sociedade, denotando a construção de um modelo interativo e comunitário.

– E como ficam as Polícias Militares?
– Elas perderam a exclusividade da atividade de patrulhamento (policiamento) ostensivo como lhes era garantido pelo Decreto Lei 667/69 e agora caso seja mantido o status da nova Lei pelo STF terão que repartir com as Guardas Municipais essa atribuição.

– A nova Lei trouxe inovações para a área de segurança pública?
– Historicamente o modelo de segurança pública no Brasil nasceu no município. O Regente Feijó, ao criar o que hoje são as Polícias Militares, deu lhes uma natureza híbrida, ou seja, militar e municipal, sendo que ao longo do tempo essas forças foram sendo transformadas em instituições substantivamente de natureza militar no sentidoestrito, e na década de 30 do século passado foram finalmente formatadas no modelo militar, quando foram submetidas ao controle do Exército Brasileiro, isto a partir da Constituição de 1934.

– O que de fato mudará para garantir a proteção da amedrontada sociedade brasileira?
– A nova Lei trouxe novidades, sendo que a principal delas foi a quebra do monopólio das Polícias Militares, que, por sinal, mesmo com os sucessivos aumentos de efetivos e melhorias na equipagem para a prestação de serviços ostensivos, não têm conseguido, motivado pela grande demanda, suprir a carência de proteção e segurança dentro dos anseios e expectativas da sociedade.

– Há tempos se fala na desmilitarização da PM e na necessidade de mudanças. Como o senhor avalia isto?
– No Brasil a Constituição trata a segurança pública como um assunto estritamente policial. Quando adentramos no artigo 144 vemos que nossos legisladores engessaram essa temática somente com a operação de órgãos policiais, ou seja, nossa democracia participativa não se efetiva na prática de nosso modelo de segurança. Mudamos o “vestido”, mas não mexemos no “corpo” dessa filha da ordem pública, qual seja a segurança pública.

– Como assim?
– A ordem pública tem um trinômio. Seus elementos basilares são: a segurança, a tranquilidade e a salubridade. No Brasil queremos preservar a ordem pública somente com a atuação policial, desprezando a importância da salubridade para o atingimento da paz social que gera a tranquilidade pública. A polícia não pode continuar sendo uma voz solo no coral da ordem pública.

– Mas a Polícia Militar é muito criticada por ser egressa do Regime Militar. Como mudar isto?
– Não estamos falando de polícia como Instituição, mas sim como uma função do Estado democrático. A polícia é um reflexo da sociedade que a empodera. Se temos uma polícia violenta é porque também a sociedade assim o é. Uma pesquisa de 2011, conduzida por Inácio Cano, mostra que 45% da sociedade é conivente com a letalidade policial contra agentes à margem da Lei. Outro estudo de 2012, dirigido por Nancia Cardia, do Núcleo de Estudos da Violência da USP, revela que 57,5% dos brasileiros são favoráveis à tortura para a obtenção de provas. Fica assim evidenciado que a violência policial, mesmo que ilegal é “legitimada” pela aprovação popular, o que evidentemente é um retrocesso inaceitável para um País que se intitula democrático.
[22h26 25/07/2015] Moisés Santana: – Então o que pode ser feito?
– As tendências de transformação são muito grandes. O modelo de segurança pública ainda precisa ser alterado, mas isto não se dará sem uma profunda reflexão societal. O ordenamento jurídico que será aperfeiçoado com o nosso amadurecimento trará ao longo dos próximos anos mudanças que nos permitam ser de fato e não só de direito uma nação democrática.

– E o senhor, o que anda fazendo atualmente?
– Lendo e escrevendo o meu novo livro.

– O que virá no seu novo livro?
– Estou discorrendo sobre a gestão colaborativa na administração do Maanaim da Igreja Cristã Maranata. Nos últimos anos tenho tido a satisfação de poder colaborar voluntariamente com a administração da Igreja Maranata, através de minha atuação como coordenador voluntário daquele bonito e espiritual lugar.

– E o futuro?
– Continuar desfrutando de minha convivência familiar e esperando com confiança a Parúsia!
COMENTÁRIOS ESPECIAIS E INÉDITOS À LEI Nº 13.022/2014.
Art. 1º - Esta Lei institui normas gerais para as guardas municipais, disciplinando o § 8o do art. 144 da Constituição Federal.
ESTATUTO GERAL DAS GUARDAS MUNICIPAIS CAPÍTULO I DISPOSIÇÕES PRELIMINARES Comentário:
Esta nova Lei destina para o município uma Instituição de Segurança Pública (há de se compreender que está no bojo do Cap. III, Art. 144 da Constituição Federal) com as seguintes características:
Natureza civil – Substituindo a natureza militar; Uniformizada e não fardada (quebra o conceito militar); Armada – Traz a concepção de força pública armada (enfrentamento). Difere do que Sir Robert Peel fez na Inglaterra ao criar a Polícia Metropolitana de Londres em 1829.
Art. 2º - Incumbe às guardas municipais, instituições de caráter civil, uniformizadas e armadas conforme previsto em lei, a função de proteção municipal preventiva, ressalvadas as competências da União, dos Estados e do Distrito Federal.
A função municipal preventiva: Primária – Social – Intervenção Precoce Secundária – Patrulhamentos dos Logradouros Públicos. Comentário:
A questão ressalva a competência do Estado, mas, no entanto direciona para o município a função de proteção municipal preventiva, o que seria até então uma atribuição da atividade de prevenção secundária afeta à Polícia Militar (Decreto Lei 667/69). Ao ressalvar as competências da União e dos Estados, institui uma ainda não bem definida natureza híbrida nas atividades ostensivas de segurança, convivendo assim com a Força Nacional (União) e as Polícias Militares (Estados).

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