quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Caos na Segurança :Com 80%, armas de fogo lideram estatísticas de homicídios e põem em xeque segurança em PE

Levantamento do G1 constatou que maioria das 96 vítimas de homicídio entre 21 e 27 de agosto foi assassinada com armas de fogo (Foto: Arte/TV Globo)

Desmonte do Pacto

Além de participar da criação do Pacto pela Vida e ajudar a implantá-lo, José Luiz Ratton fez avaliações periódicas do programa. Ao relembrar os primórdios da ideia, em janeiro de 2007, e a situação atual, uma década depois, ele acredita em desmonte gradual e paulatino da política pública. “Houve uma sabotagem silenciosa do Pacto”, avalia.
Para justificar essa avaliação, o professor do departamento de sociologia da UFPE aponta alguns fatores. Entre eles estão a incapacidade de os gestores estaduais aumentarem o investimento real na segurança, quando necessário. “É preciso estabelecer prioridade prática e não apenas retórica. Não é só uma questão policial”, alerta.
Para o especialista em segurança pública, é necessário investir em capacitação, formação, tecnologia e, principalmente, na prevenção. Ele cita um problema ocorrido, ao longo dos últimos anos, no aparato de investigação dos homicídios.
Segundo Ratton, houve um desmonte da estrutura do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP). Nos melhores momentos do Pacto, entre 2010 e 2013, quando foi possível bater a meta de redução de 12% dos assassinatos, Pernambuco conseguiu bons índices de elucidação dos crimes.
”Todos os homicídios passaram a ser investigados. O índice de resolução aumentou de 5% a 7% e chegou a mais de 50%”, diz o professor José Luiz Ratton
O professor diz que nos últimos anos a realidade mudou. “O DHPP tinha 21 delegados com competência para investigar homicídios. Havia equipes especializadas em Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLIs) e agora não existe mais. Assim as organizações criminosas foram se reorganizando”, observa.
Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), no Recife (Foto: Thays Estarque/G1)Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), no Recife (Foto: Thays Estarque/G1)
Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), no Recife (Foto: Thays Estarque/G1)
Esse déficit estrutural do departamento é reconhecido pelo gestor do estado. Ivaldo Pereira informa que o DHPP tem cinco delegacias nas áreas estratégicas. No auge do Pacto pela Vida, cada delegado tinha três adjuntos. Agora, existe apenas um delegado com duas a três equipes por delegacia. "Tinha uma equipe. Teve enxugamento”, atesta.
Na época em que as delegacias operavam com mais de um delegado, informa Pereira, a efetividade atingiu bons índices. “O número de inquéritos instaurados era quase o mesmo de documentos enviados ao Judiciário. Hoje, estamos priorizando, desde março, os casos de 2017. O índice de resolução está em 40% no estado e 34% no Recife”, afirma.
Outra questão prática apontada por José Luiz Ratton diz respeito à presença física da Polícia Militar nas comunidades de maior vulnerabilidade social. “É importante para sinalizar nas comunidades onde há grupos armados que mortes não serão toleradas”, reforça.
Para o especialista, ao longo dos anos, houve um problema de perda da capacidade de negociar com as categorias de agentes de segurança pública, bem como de reconhecer parte da legitimidade dos pleitos.
“Setores expressivos dos praças estão em greve. A PM trabalha de forma desmotivada. Há problema de comando e frouxidão de mecanismos de controle e, com isso, há a retomada de conexões de bandidos e policiais envolvidos em atitude ilícitas”, comenta.
Para Ratton, houve perda de governança. "Além disso, ambições da coalização dominante tiveram papel importante nesse processo". Essa é uma referência ao período em que o ex-governador Eduardo Campos (PSB) liderou a elaboração do Pacto, logo no início da primeira gestão no governo de Pernambuco, entre 2007 e 2010. “Ele chamou a responsabilidade e assumiu o comando do processo", lembra. Com Eduardo Campos, o comando do Pacto passou para a secretaria de Planejamento e o governador participava das reuniões uma vez por mês.
Delegado Ivaldo Pereira é o gestor do DHPP (Foto: Fernando Rêgo Barros/TV Globo)Delegado Ivaldo Pereira é o gestor do DHPP (Foto: Fernando Rêgo Barros/TV Globo)
Delegado Ivaldo Pereira é o gestor do DHPP (Foto: Fernando Rêgo Barros/TV Globo)
Aos poucos, os quadros do grupo político foram migrando para a Prefeitura do Recife – conquistada desde 2012 por Geraldo Julio – e passaram a pensar na candidatura à Presidência da República. “O distanciamento da liderança carismática, que sai para a candidatura à Presidência, e em seguida a morte, desmontam a governança”, comenta.
Com a perda paulatina dessa visão sistemática da segurança, observa o sociólogo, a liderança foi definhando. "Os corporativismos voltaram a surgir e quem comanda são os policiais”, acrescenta.

O novo Pacto

Quando o Pacto pela Vida foi instituído, em maio de 2007, Pernambuco registrava altos índices de criminalidade. No ano anterior, foram registrados 4.638 assassinatos. Isso significa 55 mortes para cada grupo de 100 mil habitantes, o que colocava o estado entre os três mais violentos do Brasil.
Diante do recrudescimento da violência, depois de o estado atingir, em 2010, 14% de redução do número de homicídios, superando a meta dos 12% imposta pelo Pacto, Ratton aponta alguns caminhos. Para ele, é preciso recuperar a capacidade de investigar os homicídios. “É necessário sinalizar para a sociedade que a garantia da vida é prioridade”, atesta.
Além disso, ele diz que o estado deve fazer a repactuação com a Polícia Militar. "É preciso encerrar a greve oculta”, diz, referindo-se ao processo iniciado em 6 de dezembro de 2016, quando líderes de associações de cabos e soldados entraram em rota de colisão com a administração Paulo Câmara (PSB). Na época, o Exército foi acionado e passou a policiar as ruas do Grande Recife. Meses depois, os principais líderes foram expulsos da corporação.
José Luiz Ratton aponta principalmente a necessidade de investir em programas de prevenção. Ele cita o Programa Atitude, que trabalha com usuários de drogas, sobretudo, crack e seus familiares. “O Programa é barato. Custa R$ 15 milhões por ano, o que não representa praticamente nada no orçamento. É um programa reconhecido internacionalmente e que precisa ser ampliado. Pode quadruplicar as ações”, sentencia.
Por último, ele afirma que é preciso recuperar a transparência dos dados informados à sociedade. Até este ano, o site da Secretaria de Defesa Social apresentava uma relação completa das vítimas de CVLIs, a cada mês, com nome, sexo, idade e local do crime. Nos últimos meses, a SDS passou a publicar apenas números consolidados da violência. “As polícias aprenderam a maquiar. Houve perda da transparência do Pacto”, ressaltou.

Gestão

O gestor do DHPP, Ivaldo Pereira, também aponta caminhos para a melhoria das ações do Pacto pela Vida. Mesmo sem reconhecer a perda de governança ou de integração entre governo e polícias, ele acredita que é preciso reforçar o investimento.
Pereira ressalta que o governo se comprometeu a fazer concursos anualmente para repor e evitar buracos nos quadros das Polícias Militar e Civil. “É preciso fazer concurso sempre. É preciso readaptar o Pacto”, resume.
Pereira também contesta a perda da transparência. Segundo ele, foi preciso implantar o novo sistema para evitar distorções. “Antes, entravam nas estatísticas as mortes a esclarecer. Havia casos de mortes que ocorriam bem depois, nos hospitais, depois da prática do crime. A atualização é constante. Só publicamos, agora, a relação definitiva e correta”, justifica.
O gestor do DHPP também destaca a necessidade de relação democrática entre o governo e as entidades que representam os policiais. “Não existe problema. As entidades devem se posicionar e o governo deve participar das negociações”, acrescenta.
Por fim, Pereira alerta para a necessidade de mais participação dos municípios nas ações contra a violência. “É preciso fazer urbanização, iluminação e garantir diversão para as pessoas nos parque e praças. Devemos impedir uso de locais públicos para a venda de drogas e precisamos atuar no fechamento de bares e boates que concentram problemas”, afirma.

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